Blog Da Poesia

Jaider Esbell

08/12/2021 08:50 - por Tiago Vargas

Artista plástico, escritor e produtor cultural indígena da etnia Makuxi. Nasceu em Normandia, estado de Roraima, em 1979. Teve sua sensibilidade cultural despertada ainda na infância pelo avô, que lhe contava fragmentos da cosmologia macuxi, como a história de Makunaimã; narrativa que deu origem ao projeto "Terreiro de Makunaima - mitos, lendas e estórias em vivências", lançado em 2012, e agraciado com o prêmio Bolsa Funarte de Criação Literária. Falecido recentemente, Esbell foi uma das figuras centrais do movimento de afirmação da arte indígena contemporânea no Brasil. Artista inovador. Sua poesia se caracterizou pela pluralidade conceitual, ancestralidade. Literatura orgânica. Sui generis.  Potente.  De memória plástica. Repleta de cores e texturas. 

E eu? O que dizer de mim quando já há quem o diga. O que pensar de mim quando já há quem o pense. Só sei que nasci no meio do mato, no berço da vida, no mato. Era noite e tinha estrelas. Meus pais também nasceram no meio do mato, igualmente à noite, e também tinha estrelas. Era verão. Cresci no vento, cabeça ao sol, pés na terra quente. Via tudo pelo avesso. Entendi cedo que tudo o que entra pelos olhos sai como verso e tudo que o verso versa é o reverso. 

Jaider Esbell
tarde é 
despedida
saudade
rota aberta
pra noite
é convite
olhar absorto
infinito
fim do dia, vermelho
fim do dia vermelho
fim vermelho
tarde tem 
calor de rodamoinho
canto de passarinho
poeira no caminho
tarde é
gostosa pra rede
delicia pra água
curta pro ócio
nostalgia

\

vamos deixar?
tudo tem sentido
isso e aquilo
mas o futuro
ele virá?
assim foi um dia
paraíso
quem vai estar
na última hora?
quem vai chorar?
saiu da floresta
entrou no labirinto
se perdeu
não tem saída
dá pra voltar?
amarga é a casca
a cura
doce é a selva
a loucura
raízes profundas vamos deixar?

\

Manhãs
toda manhã
é um bocejo
tateando
o escuro
caçando o sono
a roupa
o chinelo
a porta
 é manhã
e o cheiro
de café
por toda a casa 
irradia
é pinto na palha
gotejar na biqueira
é enxurrada
é luz em demasia
é desabrochar
é rosto e água fria
é despertar

Bodas de Granito
Carlos!
Completamos hoje, 48 anos de casados.
Bodas de granito, 
Nossa união, com confiança, fé, gentileza e amizade.
Nossos filhos, noras, netos... nossa história.
Quanta felicidade, esta é a nossa realidade!
Rosalice Ferreira Borba

Terra, território, tempo
Quantas linhas
e quantas curvas
Turvas, circulares
Tempo, Terra, Território...
O movimento é lento
Dialético, cíclico, ancestral
Pampa a dentro
Cordilheira debajo. 
América à flor da pele
Na veia, um S de Sul
De sangue vermelho rubro
Derramado em Território Sagrado
Mãe Terra, Madre Tierra, Pacha Mama
Nossa Guardiã da Vida Latinoamericana
Tende piedade, teu Continente tem sede
e tua gente, tem fome.
Salve Pacha

Desejo-te
Pulsa em mim
o desejo de ti,
num frémito urgente
de consumar no corpo
o que entre nossas almas
existe...
Vontade de tomar
teus lábios
na volúpia do beijo
molhado e sensual,
que desperte
a carne, que pulsa
em espasmos de ansiedade
É o abrir do dique
do desejo
de espalhar a semente
feita seiva
na terra fértil
do teu beijo,
em êxtase de sons,
cores,
cheiros
e por fim a serenidade... 
Ênio Santos

QUANDO MORRE UM POETA                                           
Quando morre um poeta
fecha uma fábrica de poesia.
Em geral são necessários
muitos anos para:
calibrar a mão,
libertar o espírito,
para que o poema flua,
entre em combustão,
fervilhando na alma,
se derramando em letras
para encantar quem está
preparado para ver.
Um poeta é lapidado na dor,
nas marteladas da vida,
feito escultura na pedra,
há que lixar pensamento,
colocar purpurina
no sentimento
para que não venha assustar.
Um poeta se fabrica com tempo,
dor, tristeza, alegria, encantamento,
busca em si leveza e beleza,
para em buquê o amor entregar.
Quando morre um poeta,
fecha uma fábrica de poesia.
Bernadete Saidelles

Das salas vazias
Numa sala de aula vazia
Talvez prostrados hoje num quarto à revelia
Não há mestres nem aprendizes
Numa sala de aula vazia
O quadro é negro ainda que de dia
Revela-se noite para pardos e cândidos 
Numa sala de aula vazia
Não se tem aplicado o coração estudante 
Nem enaltecido a inteligente pergunta
Numa sala sem aula 
Há vagas para o método da ignorância
Engrossar a massa subalterna
Numa sala de aula vazia
A vida prenhe de uma nova consciência
Não alastra horizontes nem a ciência
Na sala de aula vazia 
Numa metáfora da fria existência 
Só bichos escrotos se insinuam
Melhor se ocuparem das salas 
Antes que sem desígnios a tomem
E ao homem jamais retornem.
Gerson Nagel 

BARRAGEM DO CAPANÉ
O manancial que descia
Serpenteando as coxilhas
Um dia foi represado
Inundando as pradarias
Os verdes campos de outrora
Ali não existem mais
É apenas um grande lago
Pra irrigar os arrozais
O progresso transformou
A paisagem desse lugar
Mas a beleza persiste
Isso ninguém pode negar
O imenso lago azul
Cercado de verdes matas
É o lugar ideal
Pra fazer minha serenata
Como tantos outros amigos
Ali nasci e me criei
Lugar melhor nesse mundo
Se existe eu não sei
Quando a angústia me consome
E eu me sinto sem fé
Meu paraíso tem nome
BARRAGEM DO CAPANÉ.
Gonçalino Fagundes

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