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Affonso Ávila

17/05/2023 13:56 - por Tiago Vargas

Affonso Ávila nasceu em 1928 em Belo Horizonte. Foi poeta, ensaísta e pesquisador. Editou a revista Vocação, trabalhou em diversos jornais e participou da revista Tendencia. Foi ligado ao grupo de poetas concretos/práxis/processo de São Paulo, colaborando na revista de arte de vanguarda Invenção.

Em 1963 foi um dos organizadores da Semana Nacional de Poesia e Vanguarda, na UFMG. Na década de 80, criou o Instituto de Estadual do Patrimônio Histórico de Minas Gerais/IEPHA-MG e publicou vários ensaios sobre o barroco mineiro. Entre suas obras poéticas destacam-se O Açude e sonetos de descoberta, Carta do solo, Frases feitas, Código Nacional de Trânsito, Discurso de difamação do poeta, A lógica do erro, entre outros.

Em 1991 recebeu o Prêmio Jabuti de Poesia, pelo livro O Visto e o Imaginado. Sua poesia se caracterizou pela forte influência do concretismo, característica pautada na experimentação linguística e pela forte presença temática do erotismo e do engajamento ideológico. 

O poeta é visto todos os sábados no bar com um grupo de
jovens dentre eles um negro e um barbado
O poeta é visto todos os sábados no bar com um grupo de
jovens negros e barbados
O poeta é visto todos os sábados no bar com um grupo de
jovens barbados
O poeta é visto no bar com um grupo de jovens barbados
O poeta é visto no bar com um grupo de barbados
O poeta é visto com um grupo de barbados
O poeta é visto com uns barbados estranhos
O poeta é visto com uns barbados suspeitos
O poeta é visto com uns suspeitos
O poeta é um suspeito
O poeta é suspeito
O POETA É UM TERRORISTA
Affonso Ávila

IMPROVISO
A palavra justa
a mim não pertence,
busco-a nessa luta
em que não se vence,
trabalho diário,
pelo amor de sempre.
A palavra triste
a mim não pertence,
perco-a numa lide
cujo amor me vence,
trabalho diário
pelo amor de sempre.
A palavra louca
a mim não pertence,
bebo-a noutra boca
e ela me convence,
trabalho diário
pelo amor de sempre.

ARTE DE FURTAR
O poeta declarou que toda criação é tributária de outras
criações no permanente processo de linguagem da poesia
O poeta afirmou que todo criador é tributário de outros no
processo de linguagem da poesia
O poeta se confessou um criador tributário de outros na
linguagem de sua poesia
O poeta não esconde que sua poesia é tributária da linguagem
de outros criadores
O poeta não esconde que sua poesia é influenciada pela
linguagem de outros criadores
O poeta não faz segredo de que se utiliza da linguagem de
outros poetas
O poeta fala abertamente que se apropria da linguagem de
outros poetas
O poeta é um deslavado apropriador de linguagens
O POETA É UM PLAGIÁRIO

Os negros de Itaverava
Três negros de Itaverava,
irmãos em sangue e aflição,
não dormiam, como os outros,
a noite que é sujeição,
dormiam, sim, as auroras
— as luzes em combustão
dos sonhos que, mesmo estéreis,
sucedem no coração.
Enquanto as almas penadas
nos caminhos pranteavam
o corpo que se perdera
e os cães com elas choravam,
na senzala não se ouviam
os passos que se cuidavam,
as vozes que, a medo e susto,
no paiol confabulavam.
Para quem é jaula o dia,
que seja conspiração
de perfídia e sortilégio,
de roubo e contravenção
a noite cujas estradas
não se sabe aonde dão,
a noite que enlaça o negro
com seus silêncios de irmão.

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