Blog da Poesia
Célia Maria Maciel
Célia Maria Maciel nasceu em Cachoeira do Sul em 1946; é formada em Jornalismo, Letras, Ciências Sociais e Especialista em Literatura Brasileira e Escrita Criativa. Nossa poetisa é autora de Campos de arroz maduro; Mariana quatro olhos; Passo pássaro passado; Criaturas minhas; O pais do nariz, dos olhos, da boca e de outras partes interessantes... ; Perfume para Madame Rosa e Ao menor sopro, este último finalista do Prêmio Açorianos de literatura em 2014.
Célia também contribuiu com publicações esparsas em revistas, como a Ponto e vírgula e em jornais como Correio do Povo e Zero Hora. Entre os anos de 1979 e 1981 foi repórter e ... Inteligente.
Delicada e requintada cronista do Jornal do Povo.
Participou de inúmeras coletâneas/antologias, entre elas Minhas cidades, organizada por Luiz Coronel, Antologias do Sul- Poetas Contemporâneos do Rio Grande do Sul, coordenada por Dilan Camargo e das quatro primeiras edições dos Poetas do Vale.
Foi patrona da Feira do Livro de Cachoeira do Sul em 1999 e de São Sepé em 2000.
Entre as premiações recebidas destaque para o Prêmio Lila Ripoll de poesia em 2005, Concurso Literário Felippe D'Oliveira, em 2003 e Concurso de Poesia Mário Quintana em 1999.
Em 2014 Célia foi homenageada pela Escola Aldeanos do Samba com tema Trouxe o sonho de encantar, Célia Maria Maciel, é Aldeanos que hoje vem lhe homenagear, trazendo para a importante agremiação o título depois de 20 anos de espera. Trata-se de um dos nomes mais importantes e relevantes de nossa literatura.
Poetisa do verso aparentemente simples, das palavras certeiras, que ilumina pensamentos e empresta luz em seus escritos para recortes cotidianos. A poesia de Célia é de muitos adjetivos: inventiva, atemporal, genuína, contemplativa, vigorosa, minuciosa, urgente, eficaza exploradora das metáforas.
Seus poemas são de uma madurez impecável (carregados de um extraordinário poder lírico). O que dizer de versos como “não sirvo pra rosa dos ventos, nem para dança de salão, não sei dizer poemas de cor, mas conheço a ausência e sua dor – sou aquela flor – ao menor sopro''?
São escritos que transcendem. Dignificam. Engrandecem.
Sobre as palavras um olhar atento e humano; a poesia reflexiva que nos faz plenos, inteiros.
Salve Célia Maria Maciel.
Necessária e fundamental. Imprescindível para quem gosta de ler.
De árvores e partos
Só faço caso do lápis e do papel
O resto tem o meu descaso
Quanto desaponto ideias em pedaços
Desvio de alas e atalhos
E me perco deserta
Só uma palavra-água me recupera
E me arvoro a dar à luz
Um padecer poema.
A idade dos anjos
Beijos na boca podem ser fortes
Cortes – quem sabe ternos
Quase fraternos
Escapam com sabor de éter
Sal saliva anestésico
Pairam os lábios entreabertos
Junto às vértebras de um frêmito
Menos que nada etéreo sopro
E a gente quer porque quer
Que os beijos sejam eternos.
O que dói
A solidão dos outros
Nos parece distante
-navios aportados
No horizonte -
Quando a solidão é nossa
Deixamo-nos ficar
Feito rio que não encontra
O mar para desaguar.
Alguns livros de Célia:
Toalha xadrez
Café quente e goles de novas conversas
Aí perguntas se a primavera começa
Em abril
Sim cada estação é inédita dentro de nós
A primavera talvez comece no outono
Assim como o desgosto se inicia no corpo
Sobre para o rosto
E afunda no veio do olho.
É a morte este vento forte
E atrevido que até parece
Vinte ventos de uma só vez.
São vinte vozes desnorteando
O réu sem culpa a travessia
E a travessura da menina.
É a morte um suspiro círio
Sapato novo depois um lírio.
E o quase é nada.
As pernas
A centopeia tem muitas pernas. Nós
temos duas. Na Galileia, os homens
e as mulheres também só têm duas.
A vaca tem quatro.
A mesa tem quatro.
A gente caminha com as pernas.
Elas correm. Pulam. Dançam.
A gente vai onde quer.
Sem as pernas a gente também
vai onde quer. É só fechar os olhos.
E pensar coisas.
As coisas que pensamos têm pernas.
Às vezes até asas.
revoadas
Ensinar é um voo. Aprender é outro.
O primeiro é feito com os pés na terra.
O outro com a imaginação.
E às vezes é até avoado.
O primeiro provoca pés-de-vento.
O segundo ensaia ventanias.
Ensinar é feito voo rasante.
Aprender é um looping.
O primeiro é voo que seduz.
O outro quase sempre inventa luz.
Perdoa a impaciência
É custoso
Cobrir o sol
Com o manto roto
Perdoa o cansaço
É dolorido
Arrastar
O pássaro morto
Perdoa a sede
É simples
A dor de não ser.
Minha verdade é inversa
Não cabe na porta do verso
Quando acordo surpreendo-me
Nela
E a encontro
Sentada tranqüila
Como uma mulher grávida
Descascando laranjas.
Quando durmo
Ela se estende
Nas duas faces da moeda
E deixo-a seguir
Silente
Como as estrelas não perseguidas
Até que num tempo de festa
Ela possa habitar a luz.
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