Blog dos Livros
Discutindo masculinidades
Um cavalo bate os cascos nas pedrinhas portuguesas da Praça dos Três Poderes, em Brasília. A imagem é impactante e poderosa. A cena, experimentada em sonho, repete-se com pequenas variações ao longo de “Cavalo” (Editora Penalux, 345 páginas), primeiro livro do romancista brasiliense Lucas Castor.
A obra, que narra os dilemas do homem contemporâneo e os embaraços da masculinidade tóxica e compulsória, usa o animal como alegoria para explicar o arco do protagonista que passa pela placidez, pela fúria e, por fim, pela redenção. O envelhecimento e a malfadada impotência sexual atuam como elementos definidores do desenrolar da história e reforçam a vontade do autor de tratar na obra temas sensíveis aos homens. “Cavalo” foi finalista do Prêmio Mozart Pereira Soares em 2023, iniciativa que premia escritores com até 35 anos.
O livro é narrado em duas linhas do tempo distintas, uma que conta a infância e juventude de Carlos, o protagonista, e a outra, que acompanha sua vida já na meia idade.Há dois núcleos com os quais a personagem interage nesses espaços temporais. Primeiro, acompanhamos o protagonista lidar com a família: pai, mãe e dois irmãos, além de amigos e namorada. Na segunda linha temporal, assistimos a um Carlos acomodado com um emprego estável, porém solitário e sem expectativas para além do dia a dia entediante e ordinário. As figuras recorrentes em seu cotidiano são um colega de trabalho e a chefe. Esta última, inclusive, é quem o provoca a reagir diante da inércia na qual se encontra. A partir daí Carlos inicia um movimento que o levará a conflitos externos e internos e mudará em definitivo sua trajetória.
O autor divide o protagonista da obra com Brasília, a capital federal. Ainda que o tema central do livro não seja o Distrito Federal, é praticamente impossível dissociar a história do lugar. A composição das cenas remete a paisagens, arquiteturas, aromas e gostos de Brasília, e ainda a sua constituição única como centro burocrático e do poder brasileiro. Castor não nega essa influência explícita, ao contrário.
Ainda que sustente o DNA brasiliense na vida e na obra, atualmente Castor não mora mais na cidade nem no país. O autor vive entre Suíça e Portugal. Na Europa, dedica-se a escrever , a estudar e a fotografar. Formado em Antropologia pela Universidade de Brasília, cursa agora um mestrado em Escrita Criativa na Universidade de Coimbra.
Trecho:
“Mamãe estava sentada na ponta da cama de casal. Deu dois tapinhas no colchão, me convidando. Não consegui segurar o choro, ele veio de uma vez. Mamãe abraçou-me. Eu soluçava, esgasgando o catarro, soltando gemidos que não pareciam meus. Um estranho chorava dentro de mim, uma pessoinha menor, esquisita. Queria dizer a mamãe que não chorava por causa da separação, afinal era melhor para ela, e eles não eram mais um casal, há anos. Queria dizer que chorava por algo diferente, algo sem contorno, muito maior. Mas não disse nada.”
(página 39)
FOGO COMO ALEGORIA
Poeta, romancista e produtor de conteúdo catarinense, Christian von Koenig acaba de lançar seu novo livro de poemas “Acende uma fogueira para uma longa noite,” com publicação pela Editora Patuá. O livro possui orelha da escritora Monique Malcher, laureada em 2021 pelo Prêmio Jabuti com o livro de contos “Flor de Gume.” Com uma poética lapidada, Christian surpreende ao trazer o fogo como alegoria para a esperança, tema central do livro. “Os poemas são um recado a quem atravessa a noite de seus dias: acende uma fogueira,” explica o autor.
JESUS AINDA VIVE
A igreja está morrendo? Essa é a pergunta que o pastor Jonathan Fisk, autor do best-seller “Broken,” propõe em seu novo livro “Carne e sangue: por que a Igreja está morrendo se Jesus ainda vive?” Ele argumenta que a solução para a igreja não está em soluções inovadoras ou em se adaptar às tendências do mundo, mas em um retorno às palavras mais importantes que Jesus já disse. Jonathan Fisk é pastor sênior da Igreja e Escola Luterana em Rockford, Illinois, Estados Unidos, conhecido pelo seu trabalho no You Tube, no rádio e na literatura.
Leituras:
“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.”
(Carl Gustav Jung, -26 de julho de 1875/06 de junho de 1961- psiquiatra, psicanalista e psicoterapeuta suíço, fundador da Psicologia Analítica).
Destaques:
O FASCÍNIO
Autor: Tabajara Ruas
O autor leva o leitor a acompanhar a desesperada jornada do Dr. Bertholino e sua decadência moral, revelando-se um homem inescrupuloso a quem sempre espreita algo maligno. O cenário é o pampa gaúcho. Segundo o jornal El País, “é uma novela noir que combina engenhosamente o fantástico e o policial, dando uma visão sem retoques da política corrompida e da História manipulada.” Natural de Uruguaiana, RS, Tabajara Ruas é um dos maiores escritores gaúchos. Recebeu inúmeras premiações e tem livros publicados no Brasil e em 10 países, entre eles, “O amor de Pedro por João,” “Os varões assinalados,” “Netto perde sua alma” e “A região submersa.”
Editora Martins Livreiro. 119 páginas. R$ 59,90.
ANTES DO FIM DO RISO
Autor: Bert Jr.
A história acontece na capital de um país fictício em um momento pós-pandêmico, que após a perda de cinco milhões de vidas passa a apontar o riso e o humor como formas letais de contágio do vírus que devem, portanto, ser erradicadas a qualquer custo. Desta forma, passam ser adotadas medidas formais e informais de disciplina e censura à sua expressão, como a brigada anti-humor. Natural de Porto Alegre, Bert Jr. é graduado em História e em Diplomacia pelo Instituto Rio Branco. Hoje ele atua como embaixador do Brasil na República do Cabo Verde. Como escritor, estreou na ficção em 2020, com o volume de contos “Fict-Essays e contos mais leves,” o primeiro de uma trajetória de sete livros nos gêneros poesia, conto, crônica e romance.
Editora Oito e Meio. 222 páginas.
(As obras apontadas no Blog dos Livros podem ser encontradas junto à Revistaria e Livraria Nascente, na Rua Saldanha Marinho, 1423, Cachoeira do Sul)