Blog da Poesia
Raul Bopp, o erudito e o popular
Raul Bopp nasceu no dia 4 de agosto 1898 na Vila Pinhal, distrito que pertencia ao município de Santa Maria, Rio Grande do Sul. Foi jornalista, cronista e poeta. Participou com destaque na Semana da Arte Moderna de 1922, movimento que inaugurou o modernismo no Brasil. Cobra Norato foi sua obra fundamental; definida por críticos como paralelo em verso de Macunaíma, O herói sem nenhum caráter, de seu contemporâneo Mário de Andrade.
A poética de Raul Bopp se caracterizou basicamente pela estrutura do verso livre, pelo uso de elementos do folclore, pelo emprego de elementos da cultura negra, pela oralidade satírica, uso de aliterações e pela recorrência dos cenários naturais brasileiros. Autor clássico, basilar. De escrita precisa e consciente. Fusão perfeita entre o erudito e o popular.
Por: Tiago Vargas

Monjolo Chorado do Bate-Pilão
Fazenda velha. Noite e dia
Bate-pilão.
Negro passa a vida ouvindo
Bate-pilão.
Relógio triste o da fazenda.
Bate-pilão.
Negro deita. Negro acorda.
Bate-pilão.
Quebra-se a tarde. Ave-Maria.
Bate-pilão.
Chega a noite. Toda a noite
Bate-pilão.
Quando há velório de negro
Bate-pilão.
Negro levado pra cova
Bate-pilão.
Raul Bopp

Favela
Meio-dia.
O morro coxo cochila.
O sol resvala devagarzinho pela rua
torcida como uma costela.
Aquela casa de janelas com dor-de-dente
amarrou um coqueiro do lado.
Um pé de meia faz exercícios no arame.
Vizinha da frente grita no quintal:
— João! Ó João!
Bananeira botou as tetas do lado de fora.
Mamoeiros estão de papo inchado.
Negra acocorou-se a um canto do terreiro.
Pôs as galinhas em escândalo.
Lá embaixo
passa um trem de subúrbio riscando fumaça.
DONA CHICA
A negra serviu o café
– A sua escrava tem uns dentes bonitos dona Chica
– Ah o senhor acha?
Ao sair
a negra demorou-se com um sorriso na porta da varanda
Foi entoando uma cantiga casa-a-dentro:
Ai do céu caiu um galho
Bateu no chão Desfolhou
Dona Chica não disse nada
Acendeu ódios no olhar
Foi lá dentro Pegou a negra
Mandou metê-la no tronco
– Iaiá Chica não me mate!
– Ah! Desta vez tu me pagas
Meteu um trapo na boca
Depois
quebrou os dentes dela com um martelo
– Agora
junte esses cacos numa salva de prata
e leve assim mesmo
babando sangue
pr’aquele moço que está na sala, peste!
Coco de Pagu
Pagu tem os olhos moles
uns olhos de fazer doer.
Bate-côco quando passa.
Coração pega a bater.
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.
Passa e me puxa com os olhos
provocantissimamente.
Mexe-mexe bamboleia
pra mexer com toda a gente.
Eli Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.
Toda a gente fica olhando
o seu corpinho de vai-e-vem
umbilical e molengo
de não-sei-o-que-é-que-tem.
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.
Quero porque te quero
Nas formas do bem-querer.
Querzinho de ficar junto
que é bom de fazer doer.
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.
Encontrou algum erro? Informe aqui
