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Raul Bopp

19/04/2023 09:18 - por Tiago Vargas

Raul Bopp nasceu no dia 4 de agosto 1898 na Vila Pinhal, distrito que pertencia ao município de Santa Maria, Rio Grande do Sul. Foi jornalista, cronista e poeta. Participou com destaque na Semana da Arte Moderna de 1922, movimento que inaugurou o modernismo no Brasil.

Cobra Norato foi sua obra fundamental; definida por críticos como paralelo em verso de Macunaíma, O herói sem nenhum caráter, de seu contemporâneo Mário de Andrade. A poética de Raul Bopp se caracterizou basicamente pela estrutura do verso livre, pelo uso de elementos do folclore, pelo emprego de elementos da cultura negra, pela oralidade satírica, uso de aliterações e pela recorrência dos cenários naturais brasileiros. Autor clássico, basilar. De escrita precisa e consciente. Fusão perfeita entre o erudito e o popular.

Monjolo Chorado do Bate-Pilão
Fazenda velha. Noite e dia
Bate-pilão.
Negro passa a vida ouvindo
Bate-pilão.
Relógio triste o da fazenda.
Bate-pilão.
Negro deita. Negro acorda.
Bate-pilão.
Quebra-se a tarde. Ave-Maria.
Bate-pilão.
Chega à noite. Toda a noite
Bate-pilão.
Quando há velório de negro
Bate-pilão.
Negro levado pra cova
Bate-pilão.
Raul Bopp

Favela
Meio-dia.

O morro coxo cochila.
O sol resvala devagarzinho pela rua
torcida como uma costela.
Aquela casa de janelas com dor-de-dente
amarrou um coqueiro do lado.
Um pé de meia faz exercícios no arame.
Vizinha da frente grita no quintal:
— João! Ó João!
Bananeira botou as tetas do lado de fora.
Mamoeiros estão de papo inchado.
Negra acocorou-se a um canto do terreiro.
Pôs as galinhas em escândalo.
Lá embaixo
passa um trem de subúrbio riscando fumaça.


Negro
Pesa em teu sangue a voz de ignoradas origens.
As florestas guardaram na sombra o segredo da tua história.
A sua primeira inscrição em baixo-relevo
foi uma chicotada no lombo.
Um dia
atiraram-te no bojo de um navio negreiro.
E durante longas noites e noites
vieste escutando o rugido do mar
como um soluço no porão soturno.
O mar era um irmão da tua raça.
Uma madrugada
baixaram as velas do convés.
Havia uma nesga de terra e um porto.
Armazéns com depósitos de escravos
e a queixa dos teus irmãos amarrados em coleiras de ferro.
Principiou aí a sua história.
O resto,
o que ficou para trás,
o Congo, as florestas e o mar
continuam a doer na corda do urucungo.

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