Blog dos Livros
Feridas da marginalização
O pernambucano Rafael Godoy faz sua estreia na literatura com “Bichos cegos tateiam feridas” (Editora Mondru, 62 páginas), coletânea de vinte contos divididos em três partes: “Os bichos,” “A cegueira” e “As feridas.” A obra mergulha em histórias de dor, desejo, abandono e violência urbana, dando voz a personagens que habitam os limites da cidade, do corpo, do afeto e da linguagem.
Brutalidade, sexualidade, afetos, desamores, renúncias e violações atravessam narrativas em que a sobrevivência, ou a luta por ela, é o que resta a personagens margilizados vivendo as semelhanças e contradições entre homem e bicho. Com narrativas marcadas pela oralidade, o livro expõe com crueza e lirismo os embates de quem vive à margem, onde a violência cotidiana se mistura à saudade, ao desejo e à esperança.
Com narradores em primeira e terceira pessoa, os contos parecem habitar o mesmo ambiente da miséria humana. A autenticidade se revela tanto nos diálogos e trejeitos das personagens quanto na construção das cenas, intensas e surpreendentes. O ritmo poético da prosa, marcado por cadência e rima, imprime lirismo mesmo em meio à brutalidade.
Ao recusar embelezar a miséria, Godoy opta por uma escrita direta e desobediente, que não busca piedade ou redenção, mas sim escancara a falência da linguagem institucional e da lógica social. Seu texto lança o leitor diretamente no sangue e no corpo e é exatamente aí que reside sua força: na coragem de não fingir que existe conforto.
Rafael Cabral Godoy, 29 anos, nasceu em Recife, cresceu entre a capital e Camaragibe e vive atualmente no Recife. É formado em História pela Universidade de Pernambuco, período em que atuou como professor. Em 2023 concluiu também a graduação em Design Gráfico.
Dedica-se à literatura desde a adolescência. Começou escrevendo crônicas, até se encontrar no conto.
Trecho:
“Fiquei alguns anos pela casa, perambulando, mexendo nas gavetas, procurando rumo dentro da bolha. Quando pegou fogo, eu soube por um vizinho que me ligou. Corre, o fogo tá comendo tudo, tua casa agora é só cinza. Entrei contrariando os bombeiros, procurei a carta no meio do inferno e a achei no canto do que era uma estante com fotos antigas. Li uma última vez, a centésima trigésima terceira, e só então minha mãe tinha morrido, meu pai tinha sumido.”
(Página 57)
PRÊMIO POÍESIS
Estão abertas até cinco de outubro as inscrições para o Prêmio Nacional Poíesis de Literatura, que distribuirá R$ 18.500,00 aos vencedores, além de troféus e medalhas. Destinado a reconhecer talentos literários em diferentes gêneros (contos, crônicas e poemas, microcontos e minicontos), as inscrições podem ser feitas no site do Prêmio.
PRÊMIO FILIPOÇOS
Numa promoção do Festival Literário Internacional de Poços de Caldas (Filipoços), estão abertas as inscrições para o 4º. Prêmio Filipoços para Escritores Independentes, criado para descobrir e impulsionar novos talentos, com foco na categoria romance. Inscrições até 31 de outubro, podendo ser feitas no site do Festival.
Leituras:
“Gosto de ler como se o autor estivesse se dirigindo a mim naquele exato momento, independentemente do tempo que nos separa.”
-Eduardo Giannetti da Fonseca (23 de fevereiro de 1957), escritor, economista, professor e palestrante brasileiro, autor de diversos livros e artigos, ganhador por duas vezes do Prêmio Jabuti e ocupante da cadeira 2 da Academia Brasileira de Letras.
Destaques:
NA NOITE CARIOCA
Autora: Jenny Rugeroni
Com uma narrativa sensorial e intimista, o livro mergulha nas histórias de mulheres maduras que redescobrem a sexualidade, o prazer e a autoestima em meio aos desafios da maturidade. Finalista do Prêmio Escritoras Brasileiras, Jenny reúne contos ficcionais que exploram, sem pudores, as complexidades psicológicas e afetivas de protagonistas que resistem aos discursos que as invisibilizam. Autora de oito livros, ela já abordou desigualdade de gênero e dilemas femininos em outras obras, mas desta vez optou por um tom mais ousado. Natural de São Paulo e radicada em São João da Boa Vista (SP), é escritora, bancária e modelo plus-size.
Editora Samsara. 145 páginas.
O VOO DAS LIBÉLULAS E OUTROS CONTOS INFLAMÁVEIS
Autora: Kênia Marangão
Coletânea que reúne 18 contos que transitam entre o cotidiano e o insólito, explorando temas como solidão, desejo, medo e transformação. As histórias partem de situações aparentemente banais, mas se desdobram em atmosferas oníricas, revelando personagens comuns diante de momentos de ruptura. Nascida em São Paulo e radicada em Garça (SP), Kênia é graduada em Artes Plásticas pela Unicamp, tem passagens pelo Magistério, cursou Direito e atuou por anos como contadora de histórias. É seu livro de estreia.
Editora Patuá. 116 páginas.
(As obras mencionadas no Blog dos Livros podem ser encontradas na Revistaria e Livraria Nascente, localizada na Rua Saldanha Marinho, 1423, Cachoeira do Sul)
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