Blog dos Livros

Fragilidades do judiciário em romance

12/04/2024 10:30 - por Mildo Fenner

O alagoano Kleiton Ferreira conhece a Justiça no Brasil.  Além de escritor, ele também é juiz federal e já atuou como advogado por uma década. “Espada da Justiça” (160 páginas), seu primeiro romance publicado pela Editora Labrador, começou  a  ser escrito  há quase dez anos,  quando era juiz em Macaé. Natural de Arapiraca (AL), Kleiton  já morou no Rio de Janeiro, Paraíba e Sergipe. Hoje reside entre dois territórios: migrando entre sua terra natal e Propriá (SE), separadas por 70 quilômetros.

Ao apresentar  no romance um experiente juiz em crise de meia  idade, afetado por problemas familiares –a história envolve o sofrimento de um pai ao ver  a filha em um relacionamento abusivo- e  relações  acerca dos demais servidores, além de claro, as trivialidades do ofício, Kleiton discorre, de maneira sucinta e eficiente, sobre as pessoas que integram o sistema judiciário e as histórias testemunhadas  nesse ambiente.

O protagonista  do livro é Abraão, que tem 25 anos de magistratura como juiz federal e é bem-quisto pelos servidores do trabalho, além de reconhecido pelos servidores no trabalho como um profissional justo e compreensivo.  Mesmo com a vida estável, esse homem começa a questionar sua condição de pai, marido e profissional  quando Samanta, a filha adulta  volta para casa tentando  fugir do comportamento violento do marido. A paternidade de Abraão é um dos temas centrais  nessa ficção jurídica.  Com remorso pelas falhas e  ausência ao longo da vida da filha, Abraão se culpa  pelos maus tratos que ela sofreu.

Em busca de entendimento, o personagem procura um psiquiatra, mas as consultas parecem um beco sem saída. Uma reviravolta  só acontece quando Maria de Fátima, uma amiga da época de escola de sua filha,  se apresenta ao tribunal  para fazer o requerimento de uma pensão. Maria de Fátima  tem uma história marcada  por injustiças e tragédias que sensibiliza o juiz, passando a zelar pela mulher com um olhar paterno e  a leva para morar em sua casa. 

Por mais que a questão jurídica  seja o elemento condutor do romance, o escritor convida o leitor a olhar mais atentamente  para a humanidade de seu protagonista  e  das pessoas que procuram a justiça, muitas  vezes não alcançando seus direitos em razão das limitações processuais. A obra lança uma reflexão    sobre a burocracia  judicial e o papel do Estado   para amparar as pessoas e esta contrapartida é representada no livro por outro juiz que trabalha no mesmo local, um profissional inflexível, severo e  desumano.

Além de juiz federal, o autor Kleiton Ferreira  atua de forma paralela em novos projetos literários. Em um deles, conta a história de um jovem que começa a  escrever um diário e  durante o processo é cooptado  por um célula  nazista. Também está em formação uma antologia de contos, um romance  histórico e uma comédia para jovens adultos.   

Trecho:
“Durante anos e anos,  o juiz ouviu  centenas e  centenas  de mulheres chorarem a sua frente. Mães e esposas que perderam  filhos e maridos, e ali, na sala da audiência, sob o frio de um ar condicionado a 18 graus celsius, sentadas de mãos cruzadas sobre a bolsa no regaço, elas choravam. Choravam enquanto  contavam sobre suas vidas, suas dificuldades  e vivências   com os maridos mortos, os últimos momentos, ou as notícias  da fatalidade.  O pior sucedia  com as mães de falecidos filhos, que se derramavam em prantos, encharcando rosto e corpo  e  mesa de audiência, tal qual a senhora mãe de Glaubert. Elas falavam das ajudas  em vida que recebiam dos filhos, que eram tudo para elas, Marias cujas crias  vinham e  iam antes da hora,  para no fim tudo o que lhes restassem se reunir a  saudade, solidão e dificuldades financeiras. Naquele dia, Abraão chorou também. Dona Maria, mais uma mulher a pedir pensão, molhava a  cara escura  e  enrugada enquanto respondia às perguntas  do procurador do INSS, um rapaz jovem e  bem-intencionado na sua missão, mas sem sensibilidade alguma.”
(página 97)

TORTO ARADO NA FRANÇA
“Torto arado”, de Itamar Vieira Júnior, foi o grande vencedor de 2024 do Prêmio Montluc Rèsistance et Liberté, da França. No valor de cinco mil euros, o prêmio reconhece anualmente  as obras que promovam a análise, a reflexão e  a  reavaliação dos valores da resistência e  da liberdade. No Brasil, a obra é publicada pela Editora Zulma. 

BÜNDCHEN NA COZINHA 
A megaestrela Gisele Bündchen está lançando “Receitas simples para corpo e alma” (Editora BestSeller, 256 páginas, R$ 179,90), em que compartilha com o leitor formas para criar uma rotina cheia de intenções positivas, alimentos nutritivos  e  gratidão como base para um estilo de vida saudável.  São 100 receitas que apresentam sugestões  para combinações leves e  fartas, além de dicas  para tornar as refeições mais atraentes. Ela conta também histórias familiares que envolvem alimentos. 

Leituras:
“Se o conhecimento traz problemas, não é a ignorância que os resolve.” 
(Isaac Asimov  -1920/1992- famoso   escritor   e bioquímico norte-americano,  nascido na Rússia, autor de mais de   500 obras, considerado um dos mestres da ficção científica).

Destaques:
A MÁQUINA DE FAZER ESPANHÓIS


Autor:
Valter  Hugo Mãe

Depois de perder a mulher, o barbeiro  Antônio Jorge da Silva passa a  viver num lar de idosos. Os quartos da ala direita dão para um jardim onde crianças brincam. Os da esquerda, reservados aos acamados,  têm vista para o cemitério.   Neste livro, com prefácio de Caetano Veloso,  a prosa trágica e  divertida  do autor  busca, na humanidade dos que padecem, material para louvar a vida, mesmo em suas manifestações mais ameaçadas.  Valter Hugo Mãe é o nome artístico do escritor português Valter Hugo Lemos.  Nascido em Angola em 1971, além de  escritor é editor,  artista plástico, apresentador de televisão e cantor.
Editora Biblioteca Azul.  256  páginas. R$ 59,80.

O  PRÍNCIPE 


Autor:
  Maquiavel

Mesmo que o leitor nunca tenha ouvido falar em Nicolau Maquiavel, deve conhecer o termo maquiavélico. Uma pessoa é maquiavélica  quando faz qualquer coisa para atingir um objetivo. Os fins justificam os meios. Esta é a síntese do pensamento maquiavélico que se conhece hoje. “O príncipe”  foi escrito há mais de 500 anos e publicado pela primeira vez em 1532. Nas páginas do livro, escrito com o objetivo de conseguir um cargo junto ao duque, o príncipe descreve como governar  e manter o poder absoluto, mesmo que tenha que usar a força militar  e  fazer inimigos. A família de Maquiavel era de origem toscana e participou de cargos públicos por mais de três séculos. Ele acabou perdendo seu cargo  e morreu na pobreza, longe do poder. Editora  Pé da Letra. 125 páginas. R$ 49,90. 

 

(As obras apontadas  no Blog dos Livros  podem ser encontradas   junto à Revistaria e Livraria Nascente,  na Rua Saldanha Marinho,   1423, Cachoeira   do Sul) 

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