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O Sobrevivente: caçada mortal na TV

21/11/2025 08:57 - por Jorge Ghiorzi jghiorzi@gmail.com

Em um 2025 que espelha com inquietante precisão a crise econômica e o colapso social, que em outros tempos poderiam parecer apenas exagero de alguma ficção, o diretor Edgar Wright (de “Scott Pilgrim Contra o Mundo”, “Em Ritmo de Fuga” e “Noite Passada em Soho”), entrega uma nova versão do romance de Stephen King (escrito com o pseudônimo Richard Bachman em 1982), quatro décadas após a primeira versão cult de 1987 estrelada por Arnold Schwarzenegger.

A trama de “O Sobrevivente” (Running man) mantém-se fiel ao pesadelo distópico original. Num Estados Unidos falido e dominado por uma rede de TV totalitária, Ben Richards (Glen Powell), um pai desesperado pela filha gravemente doente, aceita participar do reality show mortal “O Sobrevivente”. Caçado por assassinos profissionais em uma perseguição televisionada sem tréguas, ele precisa sobreviver por 30 dias, usando astúcia e força para eliminar seus perseguidores e acumular pontos. Aos poucos, porém, Richards percebe que o verdadeiro jogo não é apenas sobreviver, mas também desencadear uma revolução capaz de derrubar o império que transforma violência em entretenimento e caos em lucro.

O diretor Edgar Wright constrói um mundo retrofuturista fascinante, com cidades em ruínas, TVs de tubo, fitas VHS e uma vigilância onipresente que critica, sem didatismo, nossa própria era de lives e algoritmos. A estética punk, as perseguições alucinantes e a trilha sonora eletrizante remetem ao melhor estilo de Paul Verhoeven (realizador do pesadelo urbano de “Robocop”), misturado ao estilo ágil e pop do realizador britânico do remake. É diversão garantida, com humor negro afiado e sequências de ação que honram o cinema comercial de alto nível.

A escalação do ator Glen Powell (de “Twisters”) é o grande acerto da produção. Longe do super-homem musculoso de Schwarzenegger, seu Richards é vulnerável e humano. Um anti-herói contemporâneo que carrega culpa, medo e fúria. Ele não só corre dos caçadores; corre também do peso de se tornar o entretenimento de um circo midiático de TV que odeia. Essa escolha dá ao filme uma camada psicológica que o original de 1987 nunca teve.

Ainda assim, por mais agradável e divertido que seja, e há muita diversão garantida em sua ação vertiginosa, “O Sobrevivente” nunca atinge o efeito perturbador que sua premissa sugere. A adaptação é direta do livro, mas suaviza o horror existencial de Stephen King em prol do espetáculo visual. O resultando, no geral, satisfaz uma audiência em busca de entretenimento bem produzido, porém, há que se reconhecer, é um tanto anticlimático em seu desfecho.

O diretor parece mais fascinado pela sociologia do futuro retrô dos EUA do que pela fúria primitiva do original. O que torna o filme uma delícia pop, mas não o soco no estômago que poderia ser. No fim das contas, é apenas uma corrida vitoriosa para o entretenimento, mas que tropeça a poucos metros da linha de chegada.

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