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Telefone Preto 2: o desafio de reinventar o medo

23/10/2025 09:56 - por Jorge Ghiorzi jghiorzi@gmail.com

O filme “Telefone Preto” (2021), dirigido por Scott Derrickson, foi uma das grandes surpresas do terror recente. Uma experiência sombria, emocional e com um vilão humano aterrorizante. Ambientado nos anos 1970, contava a história de Finney (Mason Thames), um garoto sequestrado por um assassino em série conhecido como “Grabber” (Ethan Hawke), que mantinha suas vítimas em um porão isolado.

Com a ajuda de um misterioso telefone preto, por onde os fantasmas das crianças mortas pelo vilão se comunicavam, Finney conseguiu reverter a situação, matando o assassino e encerrando o ciclo de horror.

Essa conclusão aparentemente definitiva (a morte do vilão) colocou Derrickson e o corroteirista C. Robert Cargill diante de um dilema: como continuar uma história cujo antagonista foi destruído? A resposta em “Telefone Preto 2” (Black Phone, 2025) foi transformar o vilão em algo além do humano, um ser sobrenatural, ecoando clássicos como “Sexta-Feira 13” ou “A Hora do Pesadelo”, onde o mal retorna, não mais limitado a uma existência física.

Quatro anos após os eventos do primeiro filme, reencontramos Finney assombrado por traumas e lembranças do Grabber. Ele luta contra a raiva e recorre à maconha para lidar com os flashbacks, um mecanismo de fuga do pai alcoólatra (Jeremy Davies). Já sua irmã Gwen (Madeleine McGraw), agora protagonista, sofre de sonambulismo e visões ligadas à falecida mãe.

Quando ela e o irmão decidem trabalhar em um “acampamento de inverno cristão” nas montanhas, o isolamento e a nevasca logo revelam que algo os persegue. O espírito do Grabber está de volta, e a linha entre o real e o sobrenatural se desfaz.

O realizador mantém o clima opressivo e investe em momentos de tensão visual, especialmente em torno de uma cabine telefônica desativada à beira de um lago congelado, mas “Telefone Preto 2” não tem o mesmo impacto visceral do original. O medo é mais diluído, e o roteiro, ao tentar aplicar lógica a um vilão espectral, flerta com o humor involuntário. Ainda assim, o filme encontra um tom curioso ao misturar sustos eficazes com uma melancolia que ecoa o luto e a culpa das vítimas.

O resultado é uma continuação que, embora menos assustadora, tem mérito ao não repetir a fórmula e ousar transformar seu monstro em mito. Ethan Hawke retorna em um registro quase demoníaco, evocando um vilão que parece emergir do próprio inferno cinematográfico. Uma homenagem irônica às franquias que nunca deixam seus assassinos realmente morrer.

Em síntese, “Telefone Preto 2” é um filme sobre o retorno dos traumas, pessoais e coletivos, e sobre como o horror pode evoluir junto com seus personagens. Pode não ser tão arrepiante quanto o primeiro, mas mantém viva a linha que separa, tenuemente, os vivos dos mortos.

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