Blog da Poesia
Roberto Piva
Roberto Piva nasceu em São Paulo, em 1937. Trata-se de um poeta pouco lido e desconhecido do grande público. Adepto do surrealismo e influenciado pela literatura beat-americana figura ao lado de Cláudio Willers e Sérgio de Lima como um dos maiores e melhores representantes do gênero no país. A rítmica entrecortada, o desmantelamento da versificação métrica, a batida imprevista, o múltiplo diálogo e a respiração irregular são alguns traços característicos e marcantes na obra de Piva, paramentada também pela temática transgressora e pelo erotismo excedido. Classificado como poeta maldito foi influenciado por autores da grandeza de Rimbaud, Marquês de Sade, Murilo Mendes e Jorge de Lima, a quem dedicou o poema "Jorge Lima, panfletário do caos''. No espelho da sua escrita experimentalista a imagem que reflete nem sempre é a aceitável. Sua obra inquietante e perturbadora é uma das mais intensas da literatura brasileira contemporânea.
"minha dor é um anjo ferido
de morte
você é um pequeno deus verde
& rigoroso
horários de morte cidades cemitérios
a morte é a ordem do dia
a noite vem raptar o que
sobra de um soluço".
PARANÓIA EM ASTRAKAN
Eu vi uma linda cidade cujo nome esqueci
onde anjos surdos percorrem as madrugas e tingindo seus olhos com
lágrimas invulneráveis
onde crianças católicas oferecem limões aos pequenos paquidermes
que saem escondidos das tocas
onde adolescentes maravilhosos fecham seus cérebros para os telhados
estéreis e incendeiam internatos
onde manifestos niilistas distribuindo pensamentos furiosos puxam
a descarga sobre o mundo
onde um anjo de fogo ilumina os cemitérios em festa e a noite caminha
no seu hálito
onde o sono de verão me tomou por louco e decapitei o Outono de sua
última janela
onde o nosso desprezo fez nascer uma lua inesperada no horizonte
branco
onde um espaço de mãos vermelhas ilumina aquela fotografia de peixe
escurecendo a página
onde borboletas de zinco devoram as góticas hemorroidas
das beatas
onde as cartas reclamam drinks de emergência para lindos tornozelos
arranhados
onde os mortos se fixam na noite e uivam por um punhado de fracas
penas
onde a cabeça é uma bola digerindo os aquários desordenados da
imaginação.
Na penumbra,
entre um copo e outro,
entre vencidos e excluídos
esses babacas com seus títulos,
suas poses e posses.
Eu penso em Piva, no bigode,
Na ironia de Piva.
Teton Beat
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