Blog Da Poesia

Elizabeth Bishop

30/03/2022 08:40 - por Tiago Vargas

Elizabeth Bishop foi uma poeta norte-americana, nascida em Worcester em 8 de fevereiro de 1911. Publicou poucos livros, entre os quais destaque para North & South em 1946 e A Cold Spring em 1955 — este pelo qual foi agraciada com o Pulitzer em 1956; uma das maiores honrarias literárias concebidas para escritores e poetas. Bishop foi a primeira e única mulher até hoje a receber tal prêmio. A poeta americana viveu grande parte de sua vida-obra no Brasil. Foi tradutora de Drummond, Cecilia Meireles e João Cabral de Melo Neto. Em terras tupiniquins tornou-se conhecida após a publicação do volume Poemas Escolhidos, uma antologia com seleção e tradução de Paulo Henriques Britto. Em seus 68 anos de vida, publicou 101 poemas dividido em três livros. Modernista. Sua escrita perfeccionista se caracterizou pela intelecção de pensamentos e pela temática existencial. Em um de seus melhores poemas Bishop nos lembrou de algo simples, mas substancial e recorrente. Viver e conjugar o verbo perder: “Perca um pouco a cada dia. / Aceite austero, a chave perdida, a hora gasta bestamente. / A arte de perder não é nenhum mistério”. O cotidiano e a existência como uma verdadeira degusta universal. No Brasil viveu por mais de 20 anos, tendo uma relação amorosa com a paisagista Lota de Macedo Soares. Sua história de vida foi retratada no filme “Flores Raras”, do cineasta Bruno Barreto, de 2013. 

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A arte de perder
A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
De perdê-las, que perder não é nada sério.
Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
A chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Depois perca mais rápido, com mais critério:
Lugares, nomes, a escala subsequente
Da viagem não feita. Nada disso é sério.    
Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
Lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Perdi duas cidades lindas. E um império
Que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.
- Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério.
Elizabeth Bishop

Sozinha nos trilhos eu ia,
coração aos saltos no peito.
O espaço entre os dormentes
era excessivo, ou muito estreito.
Paisagem empobrecida:
carvalhos, pinheiros franzinos;
e além da folhagem cinzenta
vi luzir ao longe o laguinho
onde vive o eremita sujo,
como uma lágrima translúcida
a conter seus sofrimentos
ao longo dos anos, lúcida.
O eremita deu um tiro
e uma árvore balançou.
O laguinho estremeceu.
Sua galinha cocoricou.
Bradou o velho eremita:
“Amor tem que ser posto em prática!”
Ao longe, um eco esboçou
sua adesão, não muito enfática.
Elizabeth Bishop

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O iceberg imaginário
O iceberg nos atrai mais que o navio,
mesmo acabando com a viagem.
Mesmo pairando imóvel, nuvem pétrea,
e o mar um mármore revolto.
O iceberg nos atrai mais que o navio:
queremos esse chão vivo de neve,
mesmo com as velas do navio tombadas
qual neve indissoluta sobre a água.
Ó calmo campo flutuante,
sabes que um iceberg dorme em ti, e em breve
vai despertar e talvez pastar na tua neve?
Esta cena um marujo daria os olhos
pra ver. Esquece-se o navio. O iceberg
sobe e desce; seus píncaros de vidro
corrigem elípticas no céu.
Este cenário empresta a quem o pisa
uma retórica fácil. O pano leve
é levantado por cordas finíssimas
de aéreas espirais de neve.
Duelo de argúcia entre as alvas agulhas
e o sol. O seu peso o iceberg enfrenta
no palco instável e incerto onde se assenta.
É por dentro que o iceberg se faceta.
Tal como joias numa tumba
ele se salva para sempre, e adorna
só a si, talvez também as neves
que nos assombram tanto sobre o mar.
Adeus, adeus, dizemos, e o navio
segue viagem, e as ondas se sucedem,
e as nuvens buscam um céu mais quente.
O iceberg seduz a alma
(pois os dois se inventam do quase invisível)
a vê-lo assim: concreto, ereto, indivisível.
Elizabeth Bishop

Poeta da Cura
diante de tantas tristezas
o ato mais revolucionário talvez seja manter a poesia 
a criação a ternura o gosto pelo bom da vida
existem momentos
como esse 
como o agora 
como o hoje 
que gostaria eu de ser um poema cósmico ao vento
lembrar a forma da poesia como um movimento interior 
a ternura o gosto pelo bom da vida
que meu poema possa curar solto ao vento os corações 
e mentes doentes
quem dera
que meu poema curasse as feridas de hoje
Mirela Kruel

Tivesse ouvidos, musicaria. 
Tivesse olhos, um ‘pintador’. 
Tivesse olfato seria um gato.
Tivesse eu tudo
- em harmonia -
Seria guia, seria livre,
Pois bastaria, um simples verso,
De boca torpe, ouvidos claros,
Mãos afinadas, poetador.
Dilso J. Dos Santos

Sentido da vida
Qual o sentido da vida?
Me pergunto a cada dia, 
A cada hora
E não encontro resposta
Penso, escrevo, respiro
Qual o sentido de tudo isso?
Dizem que é ter dinheiro, discordo!
Reflito, o segredo não é ser milionário
Segredo é ser rico,
Sim, não me chame de sarcástico!
Fortuna se perde
Riqueza não se compra.
Bruna Felten

Recarrego
baterias do encanto 
teço alegrias 
numa colcha colorida
com pedaços de vento 
areia nos olhos
areia nos dentes
ao apreciar balanço 
sol vai
lua vem
mostrando que
meu patrimônio 
são todas as sensações 
registradas, tatuadas, guardadas
nos poros das lembranças 
Bernadete Saidelles

Prazer de existir
A roda dos ciclos gira
Percorreu muitas trilhas
De tormentas e calmarias
Domou e ressignificou dores
Nos territórios afetivos
Povoados de presenças
Habitam muitos rostos
Vozes e aconchegos
Nas varandas do seu coração
Crescem jardins de verbenas
Ervas lançam curas
Portas ensolaradas abrem-se
Rompendo ilusões, renova-se,
Ensaia um sorriso Monalisa
Rememora realizações
Dança, celebrando seu ciclo
Entregando-se ao gozo e deleite
Ao puro prazer de existir
Morde a maçã de ouro
Colhida no Jardim das Hespérides
A vida gaivota livre
Carpe, carpe diem
A poiésis da sua alma a aquece
Magalhe Oliveira

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