Blog Da Poesia

José Craveirinha

02/02/2022 14:30 - por Tiago Vargas

José Craveirinha nasceu nas periferias de Lourenço Marques, atual Maputo. Era filho de pai português e mãe ronga. Foi jornalista e poeta. Referência na escrita africana. Como jornalista, contribui para inúmeras revistas e jornais moçambicanos, incluindo Voz de Moçambique, Voz Africana, O Brado Africano, entre outros tantos.  Foi um dos pioneiros do movimento Negritude e publicou seis livros de poesia entre 1964 e 1997. Escreveu sob vários pseudônimos, Mário Vieira, José Cravo, Abílio Cossa ... Sua escrita, de influência surrealista, caracterizou-se pela natureza social baseada nos estratos mais profundos de seu povo. Poeta peculiar. Seus versos abordavam com propriedade questões como o racismo e a dominação colonial. Em 1997, Craveirinha recebeu o Prémio Camões: a maior honra do mundo para a literatura lusófona em 1991.  O poeta africano também foi indicado várias vezes ao Prêmio Nobel de Literatura. 

Um homem nunca chora
Acreditava naquela história
do homem que nunca chora.
Eu julgava-me um homem.
Na adolescência
meus filmes de aventuras
punham-me muito longe de ser cobarde
na arrogante criancice do herói de ferro.
Agora tremo.
E agora choro.
Como um homem treme.
Como chora um homem!
José Craveirinha

Reflexões no dia
dos meus anos
Faço anos.
Quantos já não interessa.
Por uma questão de glândulas
infalivelmente na barba e nas têmporas
aos poucos e poucos envelheço.
Faço anos e neste dia
há sempre umas recordações interessantes
ao mesmo tempo que mudamos na aparência
e aos outros parecemos bem conservados
enfim!
Não expirado o prazo da minha ausência
no meu bairro da Munhuana
no preciso dia do meu aniversário
lá com certeza o dia amanheceu
todo assoado de nuvens.
Ah, tudo se transforma!
Eu que faço anos
e o tempo inexorável não perdoamos
aos que não acreditam em augúrios
e apesar das mil coisas tristes
os cabelos brancos embelezam-me as fontes
e as notícias nem sempre são todas más
e em segredo algumas
até me rejuvenescem intimamente.
Faço anos
e o bolor da saudade arroxeia-me as olheiras
e dá-me um ar de homem circunspecto
que lê Camus.
Mas ao mesmo tempo que admiro as viagens espaciais
os antibióticos
e por exemplo a televisão
ainda me embriaga a retina
um quadro de Portinari
o andar cadenciado duma mulher
um bom jogo de futebol
e um autêntico céu azul a milhafres de nada.
José Craveirinha

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O APOSENTADO
Trabalhei a vida inteira
enquanto eu tinha vigor
cumprindo todos os deveres
de um bom trabalhador
Paguei taxas e impostos
e nada era barato
e sempre no fim do ano
mais dois ou três sindicatos
Até meus sessenta anos
levei uma vida normal
Contribuía todo mês
com a Previdência Social
Guardei todos os carnês
numa gaveta do armário
E pensei: vou me aposentar
com mais de quatro salários
Ledo engano que eu tive
Cortaram meus numerários
dizendo ser resultado
do fator previdenciário
E o dinheiro que eu contribuí
e que era pra estar guardado
por engano foi parar
no bolso de um deputado
Depois de aposentado
pensei que iria descansar
com uma vida tranquila
sem nunca mais trabalhar
Mas como que eu vou viver
sem receber mais algum
se os meus quatro salários
viraram em apenas UM!!
Gonçalino Fagundes

Musa e poeta
O amor se vestiu de noite
com seu brilho próprio
iluminou a madrugada
insone
de lençóis revoltos 
e sussurros líricos
no aguardo do primeiro
raio de sol 
Todavia a chuva se fez presente
sinfonia sobre telhado de zinco 
O amor se vestiu de dia 
e se banhou na bátega de água 
com sedução 
e sim à vida 
Jorge Rosa

O tempo passa
O tempo tudo cura
Que remédio é esse?
Prescrito a cada tormento
Por bocas alheias
Que não vestem suas dores
Do tempo
Só quero que não me apegue às lembranças
Nem roube minha lucidez
No mais
Deixa o tempo vir, passar, correr
E me levar em paz. 
Tatiana Linhares

Para que serve o sorriso?
Para abafar um desejo
Enganar a saudade
Esperar pelo beijo
Perdido...
Satisfazer um anseio
Escondido...
Expulsar uma lembrança
Que teima e insiste
Trazer de volta a tristeza
Ou viver a esperança
Surgindo ao longe... enfim...
Neícla Bernardes

Bailarina
Sonhos
Transcendem
A bailarina, o céu e a palma 
Da mão;
Devaneios
Relativizam,
A bailarina, o véu e a clara
Aptidão;
Planos,
Dimensionam
A bailarina, o solo e o passo
Da razão.
Márcio Mór Giongo

O amor
O amor é a expressão viva do Espírito,
Que habita na alma,
E manifesta-se no corpo
Que habita a terra. 
Cristina Gomes

Quero...
Abraço Apertado
Assim meio de lado
Pedido só com olhar...
Quero...
Jogar o teu jogo
Coisa de Ogro
Brincar neste mar...
Quero...
As tuas mordidas
Passagens de ida
Férias em qualquer lugar...
Quero...
Tua voz na canção
Descer na próxima estação
Viver de AMAR!
Mara Garin

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