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Batman Eternamente: extravagância neon revisitada
Celebrando três décadas desde o seu lançamento, “Batman Eternamente” (Batman Forever), dirigido por Joel Schumacher, retorna às telas de cinema como um relançamento que mexe com nossas memórias. Não como uma joia esquecida, mas como um artefato peculiar de uma era audaciosa, por vezes desastrosa, do cinema de super-herói.
O filme é, do primeiro ao último minuto, uma extravagância desmedida, um festival de exageros que beira o inacreditável. O tempo, longe de tê-lo redimido, apenas confirmou o que a crítica e o público já sabiam em 1995, pois trata-se de um equívoco criativo de proporções monumentais.
A tênue trama serve meramente como fio condutor para uma sucessão de cenas caóticas. O Batman (Val Kilmer) precisa enfrentar uma dupla de vilões: Duas-Caras (Tommy Lee Jones), um ex-promotor público desfigrado e obcecado pelo acaso, e o Charada (Jim Carrey), um gênio da tecnologia que lança enigmas mortais sobre Gotham City.
Enquanto isso, o herói também se vê atraído pela psiquiatra Dr. Chase Meridian (Nicole Kidman), que está igualmente interessada em estudar a mente do homem por trás da máscara. A narrativa é um mero pretexto para Schumacher mergulhar sua Gotham City em um oceano de luzes neon, roupas de couro, e tomadas absurdamente amplas dos músculos do Batman.
É no campo das atuações, porém, que o filme atinge seus picos mais surreais de descontrole. Tommy Lee Jones, um ator de talento inquestionável, interpreta Duas-Caras com uma fúria tão desmedida e caricata que beira a paródia. Ele rosna, grita e espuma pela boca em cada cena, sem uma pitada da nuance trágica que o personagem merece.
Jim Carrey, na esteira do sucesso explosivo de “O Máskara”, leva sua persona hipercinética ao extremo absoluto. Seu Charada é menos um gênio do crime e mais uma versão alucinada do seu personagem cômico Ace Ventura, contorcendo-se e tagarelando em um ritmo frenético que cansa mais do que diverte. Juntos, eles formam uma dupla de vilões que não ameaça, mas simplesmente oprime os sentidos com seu excesso.
A receptividade na época foi relativamente mista, ainda que seus aspectos negativos tenham sido reconhecidos até pelos mais ferrenhos fãs do personagem. O público e a crítica estavam ainda apegados ao tom sombrio e gótico estabelecido por Tim Burton nos dois primeiros filmes. “Batman Eternamente” foi recebido como uma guinada brusca e barulhenta em direção ao camp e ao comercialismo puro.
A saída de Burton e de Michael Keaton foi sentida profundamente, e a escolha de Joel Schumacher, cuja filmografia (“Os Garotos Perdidos”, “Um Dia de Fúria”) não sugeria afinidade com heróis mascarados, mostrou-se um erro crucial. O diretor admitiu ter se inspirado principalmente na série de TV dos anos 60, e isso explica tudo. A atmosfera é deliberadamente kitsch, uma celebração do absurdo que ignora completamente a complexidade do homem-morcego.
Reassistir ao filme 30 anos depois provoca um sentimento peculiar. A princípio, a avalanche de más decisões criativas ainda assusta. No entanto, visto através da lente da nostalgia e da condescendência que o tempo concede, “Batman Eternamente“ ganha um charme acidental. Ele se torna um documento de sua época, um produto de estúdio desesperado para ser pop e vender brinquedos.
É impossível não sentir uma ponta de lamento por Val Kilmer, um ótimo ator preso no meio desse furacão de mau gosto, tentando em vão trazer um pouco de seriedade a um set que mais parecia um circo. “Batman Eternamente” não é um bom filme, mas três décadas depois, sua falha catártica e honesta é, de uma forma estranha, mais digna do que os produtos calculados e sem alma que às vezes vemos hoje. É um erro glorioso, e como tal, merece ser lembrado.
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